Atualmente, não tem como falar sobre locações de imóveis por temporada, em especial para período de férias, sem pensar no Airbnb.
O Airbnb é um serviço online comunitário para as pessoas anunciarem, descobrirem e reservarem acomodações e meios de hospedagem por período à livre escolha. Ou seja: nada mais é que uma locação temporária feita de forma online.
Hoje, é conhecido mundialmente, com acomodações espalhadas literalmente por todo o mundo. Segundo o próprio Airbnb, o serviço está disponível em 191 países, contando com mais de 2 milhões de acomodações em 65 mil cidades do mundo inteiro.
O aplicativo trouxe abrangência, acessibilidade e facilidade para aquele que tem um imóvel disponível e aquele que está interessado em locar um imóvel.
A vantagem ainda se estende na menor burocracia exigida pelo site quando comparado com imobiliárias, que costumam possuir seu próprio processo de avaliação de imóveis, taxa de administração e até idoneidade do interessado na locação. Segundo estudo da Oxford Economics, a comunidade de hóspedes do Airbnb garantiu mais de 300 mil empregos em 30 comunidades analisadas no estudo em diversos países ao longo de 2019, incluindo restaurantes e varejo, logo no início da Pandemia.
Porém, é possível aplicar as mesmas regras e leis de Contratos de Locação por Temporada para essas locações?
O que a legislação brasileira diz a respeito?
1. Embasamento Legal
Primeiramente, vale salientar que o Airbnb é um serviço relativamente recente, não só no Brasil, como em todo o mundo.
Dessa forma, assim como foi com o surgimento de aplicativos de transporte, como por exemplo o Uber, ou serviços de entrega (iFood), às vezes, é necessário tempo para que determinado país possa enquadrar serviços atuais na sua legislação.
Logo, atualmente, não há legislação específica que trate sobre as locações negociadas pelo Airbnb, sendo necessário acompanhar as decisões judiciais.
Considerando o grande impacto social e econômico, é questão de tempo até que o legislador possa criar lei específica para aplicação em todas as relações entre proprietários de imóveis e interessados.
Também vale salientar que, não havendo lei específica, as regras podem mudar com frequência.
2. Mas o que se tem até agora?
Considere o seguinte cenário: Você, uma pessoa extremamente organizada, programa passar a virada do ano no litoral com familiares. Após uma longa busca, encontra um imóvel que aparentemente irá atender às necessidades durante as férias, com conforto e em um valor que cabe no orçamento.
Ao chegar lá, fica sabendo que sua reserva foi cancelada, ou que o imóvel nunca foi disponibilizado para locação e que as informações que constam no anúncio não são do proprietário do imóvel. Pode, inclusive, constatar que as fotos que você viu não são do imóvel real.
O que fazer?
Embora não haja legislação específica para tratar de eventuais problemas que possam surgir, os contratos firmados pelo Airbnb não estão isentos de penalidade pelo descumprimento ou irregularidade.
Alguns Tribunais, como em São Paulo, por exemplo, têm aplicado as regras do Código de Defesa do Consumidor (CDC), para condenar a empresa Airbnb pelos prejuízos suportados pelo cliente que se encontra diante de situações como a do exemplo acima.
De acordo com alguns casos, os Tribunais decidiram que as plataformas de locação de curtas temporadas, como o Airbnb, não são meras intermediárias de hospedagem e que devem responder por eventuais defeitos na prestação dos seus serviços por quem aluga o imóvel.
Mesmo que o Airbnb não seja o real locador do imóvel destinado a quem procura em sua plataforma, é esta a empresa que o locatário, que é considerado consumidor, busca para garantir sua hospedagem conforme o local contratado, suas especificidades, o preço ajustado, bem como é a própria empresa que garante que o consumidor, ou seja, quem loca, não está ingressando em uma fraude.
Assim, fica claro que não cabe a quem loca arcar com os ônus de uma hospedagem frustrada e a empresa, tal como a Airbnb, deve arcar com os prejuízos eventualmente ocasionados, cabendo à própria empresa buscar suas eventuais reparações aplicadas ao proprietário.
3. E é possível a exigência de danos morais?
Sobre a possibilidade de reconhecimento de danos morais para aqueles que foram vítimas na falha na prestação de serviços, quando do uso da plataforma Airbnb, os Tribunais brasileiros têm entendido como um dano moral presumido.
O dano moral presumido nada mais é que aquele que decorre da mera comprovação de uma conduta ilícita, ou seja, algo ilegal, sendo desnecessária a demonstração de prejuízos concretos ou a apresentação de provas do efetivo abalo moral.
No caso de irregularidades em locações junto ao Airbnb, vemos o caso de aplicação do dano moral presumido em casos como de, por exemplo:
Veja que aqui trouxemos apenas uma lista exemplificativa e que cabe ao juiz a análise do caso para real aplicação do dano moral.
Quanto ao valor, isso também varia muito do entendimento do juiz, sem encontrar um parâmetro ou valor fixo, sendo avaliado caso a caso.
4. Direito de Arrependimento/Cancelamento
Considerando que os Tribunais têm determinado que a relação firmada entre a pessoa interessada em locar e o proprietário do imóvel intermediada pelo Airbnb como relação comercial, tem-se também a aplicação de prazos para desistência da reserva feita.
A legislação assegura o direito de arrependimento ao consumidor sempre que vir a contratar um serviço fora do estabelecimento comercial.
Assim, segundo o artigo 49 do CDC, o consumidor, usuário do serviço oferecido pela plataforma digital, reservando um imóvel, tem o direito de arrependimento no prazo de 7 dias, contando do fechamento do negócio ou da reserva.
Porém, vale ressaltar que a política do Airbnb determina que cada anfitrião ou proprietário do imóvel define sua própria política de cancelamento.
Ou seja, quando fechada a locação, surgirão as informações sobre o cancelamento, não havendo possibilidade de ciência do locatário antes da reserva.
Caso o usuário se sinta lesado pela política imposta, ocorrendo situação fora de uma razoabilidade ou por ausência de informação clara e precisa, nasce o direito de debater judicialmente eventual prejuízo suportado.
5. Impedimento de locação pelo Condomínio
No último ano, considerando o aumento de locações intermediadas pelo Airbnb, muitos moradores de condomínio que possuem imóveis disponíveis para locação passaram a se incomodar.
E os motivos são diversos e fundamentados: insegurança pelo trânsito de pessoas diferentes e a distribuição de cópias de chaves e controles para desconhecidos, falta de preparo dos funcionários habituais para recepção de visitantes, inclusive estrangeiros, descumprimento das regras do Regimento Interno, dentre outros.
Por isso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) emitiu duas importantes decisões e que refletem diretamente nas locações pelo Airbnb.
A primeira, firmada em abril de 2021, entendeu que as características das locações pelo Airbnb, quer seja, hospedagem remunerada, com múltipla e concomitante locação de imóveis ou quartos por curto tempo e em contrato não regulado por legislação, não são consideradas residenciais.
E o que isso significa na prática?
Que imóveis localizados em regiões ou condomínios residenciais não poderiam ser disponibilizados para locação em sites de intermediação, como o Airbnb.
Já a segunda decisão, disponibilizada em novembro de 2021, determinou que os condomínios podem proibir proprietários de alugarem seus imóveis por curta temporada, como os realizados por meio do Airbnb.
Ressalta-se que ambas as decisões refletem apenas no caso concreto avaliado pelo Judiciário em questão, não devendo se aplicar para todos os casos. Mas tudo indica que o aumento de processos com o mesmo teor, dadas as primeiras sentenças neste sentido.
Porém, é provável que o tema seja pauta de discussão em diversas reuniões de condomínio nos próximos meses, com o intuito de regrar essa modalidade de locação temporária.
De qualquer forma, qualquer decisão em condomínio deverá ser discutida e votada em Assembleias devidamente convocada, segundo a legislação específica sobre o tema.
Aqui, vale uma nota de atenção: aos interessados em locar o imóvel, é imprescindível comparecer à Assembleia, demonstrar seu ponto de vista e defender seus interesses. A regra da boa convivência deve sempre vir em primeiro lugar e a negociação extrajudicial se mostra mais favorável.
6. Conclusão
O mais importante nesse tipo de discussão é que o proprietário ou consumidor possui ferramentas importantes para proteção legal, ainda que não haja legislação específica; não se trata de “terra sem lei”.
Atualmente, o Código de Defesa do Consumidor respalda aquele que loca de possíveis extravagâncias ou inseguranças que possam surgir e o judiciário já tem emitido decisões neste sentido.
Ainda, a parte que se sentir lesada de alguma forma, pode contatar um advogado para ver suas opções e, se necessário, ingressar com o devido processo legal.