Direito Imobiliário

COMO POSSO GARANTIR MEU CONTRATO DE LOCAÇÃO?

Todo mundo que tem um imóvel disponível para locação ou quer locar um imóvel se depara com a situação: garantias locatícias.

Ainda que em todas as relações contratuais, ao se iniciar, a expectativa é que as partes cumpram com o seu papel, independente do que seja, eventualidades podem acontecer.

A pandemia está aí para mostrar que isso é real: eventualidades são as únicas certezas da vida.

E pela inadimplência existir, são necessárias as garantias locatícias.

Então, você que tem um imóvel para locar, como pode se proteger da inadimplência?

Quais as garantias disponíveis pela Lei do Inquilinato? É possível exigir mais de uma garantia? Essas e muitas outras dúvidas rodeiam aqueles que desejam locar um imóvel.

Então, continue lendo para tirar todas as suas dúvidas sobre o tema.

  1. O que são as Garantias Locatícias?

O que você pensa quando se fala em garantia?

Uma garantia nada mais é que uma forma de assegurar o cumprimento do contrato ou indenizar a parte que foi lesada.

As garantias não são exclusivas do contrato de locação. Podemos usar garantias em todos os tipos de contratação, como na compra e venda de imóvel, locação, compra de bem durável, dentre outras.

A Lei do Inquilinato, a lei que regra todos os contratos de locação de imóveis urbanos, descreve quais garantias podem ser utilizadas. Portanto, não é de livre escolha do locador ou do locatário, precisando se limitar às opções descritas na lei.

O artigo 37 da Lei do Inquilinato lista as seguintes garantias locatícias disponíveis. São elas:

  • Caução;
  • Fiança;
  • Seguro de fiança locatícia;
  • Cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento.

Quais são as vantagens e desvantagens de cada uma delas? O que é exigido e quais as regras para uma delas?

Abaixo, detalhamos cada uma delas para você conhecer melhor.

  1. Caução Locatícia

A primeira garantia listada pela Lei do Inquilinato é a Caução. Pode não parecer, mas essa garantia ainda é muito utilizada comercialmente.

A caução é uma forma de garantia na qual o locatário fornece ao locador um bem, móvel ou imóvel, que deverá permanecer a disposição por todo o período da locação. A caução pode ser utilizada tanto para suprir valores de aluguéis e encargos em atraso como para reparos no imóvel por danos causados pelo locatário.

Essa modalidade tem várias opções, listadas abaixo:

  • Caução em Dinheiro:

É a opção de caução mais conhecida no mercado imobiliário.

Neste caso, o valor máximo que pode ser exigido do locatário é de três vezes o valor do aluguel.

A caução em dinheiro deverá ser depositada em caderneta de poupança no início da locação, autorizada e regulamentada pelo Poder Público.

Ao final da locação, se não utilizada, a caução deverá ser restituída ao locatário, acrescida dos rendimentos tidos no período da locação.

E a caução deve abranger apenas o valor do aluguel ou também se inclui os encargos, como condomínio e IPTU?

Depende. A lei trata apenas do valor do aluguel, mas há Tribunais que entendem ser possível incluir os encargos na hora de se considerar a garantia. Portanto, vai do entendimento e negociação das partes.

Além disso, se a caução ficar insuficiente, ainda que com os rendimentos da poupança, mas que não acompanhar a elevação dos aluguéis, poderá o locador exigir o complemento.

  • Caução de Bem Móvel:

O Código Civil considera como móveis, para efeitos legais: as energias que tenham valor econômico, os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes e os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações.

Ou seja, os bens móveis citados acima podem ser ofertados como caução em garantia nos contratos de locação, obrigação esta também conhecida de ‘penhor’.

A lei determina que deverá ser registrada em cartório de títulos e documentos. Com efeito, após a assinatura do contrato, a parte deverá providenciar o seu registro., para que surta efeito em relação a terceiro.

Em sendo o ofertado um automóvel, além do registro no Cartório de Títulos e Documentos, também será necessário que o locatário apresente certidão negativa emitida pelo DETRAN para demonstrar a propriedade, bem como ausência de pendências ou ônus de qualquer natureza.

Caso haja alguma inadimplência, o locador poderá resgatar o título ou as ações.

  • Caução de Bem Imóvel:

Também temos a possibilidade de dispor de bem imóvel para garantia da locação.

O locatário deverá averbar o contrato de locação na respectiva matrícula do imóvel dado em garantia.

Essas providências de registro e averbação vão possibilitar a terceiros o conhecimento da garantia ofertada. Portanto, essa é um a medida importante.

  • Títulos de Crédito:

Aqui também temos um conhecido do mercado locatício: o título de capitalização.

É uma saída para quem deseja alugar um imóvel sem depender de terceiros, bastando adquirir o título de crédito em instituição financeira e oferecê-lo em garantia.

Diferente da caução em dinheiro, o título de capitalização não possui um valor máximo para fixação, encontrando no mercado exigências de até 12 vezes o valor do aluguel, o que assusta e impede que muitos locatários firmem contratos com essa garantia.

Ainda, como a caução, ao final da locação, estando cumprida a obrigação principal (adimplemento de aluguéis e conservação do imóvel) deverá o título de crédito ser revertido ao locatário.

  1. Fiança

Sem dúvida, essa é a garantia mais popular no Brasil no que diz respeito a locações de imóveis.

A fiança tem amparo legal no Código Civil e na Lei do Inquilinato e se trata de uma garantia pessoal, ou seja, o fiador garante pessoalmente o cumprimento das obrigações. Dessa forma, ele responde com todo o seu patrimônio.

O fiador responde pelas dívidas, caso o locatário não cumpra as obrigações. Por isso, é importante saber se aquele que se propõe a ser fiador possui boa condição econômica.

Portanto, é normal se solicitar comprovações da capacidade econômica do fiador no período de negociação da locação. As formas são das mais diversas: apresentação de Carteira de Trabalho, Declaração de Imposto de Renda, movimentação bancária, matrículas de imóveis, por exemplo.

  • A Fiança é para sempre?

De forma direta, a resposta para essa pergunta é não precisa ser.

Inicialmente, vale ressaltar que o contrato de fiança é apêndice ao contrato de locação, tendo seus próprios termos.

Ao longo da locação, o fiador pode perder sua capacidade econômica inicialmente comprovada. Pensando nisso, a lei garante ao locador a possibilidade de solicitação da mudança do fiador.

O mesmo vale para o caso de falecimento do fiador.

Ao fiador, a lei também prevê formas de exonerar-se da garantia. Afinal, a relação entre fiador e afiançado é de confiança: uma vez que essa relação se rompe, aquele que se vê sob risco de ter seus bens afetados pela ação de terceiros deseja tomar medidas para proteção.

Uma das formas de proteção do fiador é fixar o contrato de fiança apenas pelo período de vigência do contrato de locação, não abrangendo a locação pelo prazo indeterminado.

Neste caso, o fiador encaminhará ao locador a solicitação de exoneração da fiança, ficando os efeitos da fiança valendo por 120 dias após a notificação.

Em todas essas opções, o locatário terá 30 dias para alteração do fiador, sob pena de rompimento do contrato de locação.

  • O Fiador é obrigado a apresentar um bem imóvel como garantia?

Aqui vale lembrar o que é o contrato de fiador: é uma garantia pessoal e não uma garantia real, ou seja, esse tipo de garantia está baseada na fidelidade do garantidor em cumprir as obrigações, caso o devedor não o faça e não vinculam nenhum tipo de bem material.

Portanto, a apresentação de matrícula do imóvel de propriedade do fiador tem, como fim, a comprovação da renda e da possibilidade de garantir a locação, e não como uma segunda garantia.

Dessa forma, exigir-se tanto a apresentação do fiador quanto à vinculação do imóvel de propriedade desse, com a exigência de registro na matrícula do imóvel configura-se dupla garantia, prática não permitida pela Lei do Inquilinato.

  • Vale a pena exigir fiador com duas matrículas?

É prática comum a apresentação de fiador que tenha pelo menos dois imóveis de sua propriedade, sem ônus. Isso tudo para evitar a impossibilidade de penhora de imóvel de propriedade do fiador por se tratar de único bem e, portanto, bem de família.

Se a tarefa de encontrar um fiador para locação era difícil, ela passa a ser impossível.

Porém, a Lei 8.009/1990 previu um rol de exceções à regra de impenhorabilidade do bem de família, entre as quais está a obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Por isso, após diversas discussões, em maio de 2022, o Supremo Tribunal Federal decidiu pela constitucionalidade da penhora do bem de família do fiador no contrato de locação, seja residencial, seja comercial.

A decisão ressaltou que a lei não distinguia os contratos de locação para fins de afastamento de regra de impenhorabilidade do bem de família. Assim, não seria possível criar distinções onde a lei não o fez, sob pena de violar o princípio da isonomia no instituto da fiança.

Além disso, reconhecer a impenhorabilidade do imóvel do fiador, além de violar o princípio da autonomia da vontade negocial, geraria impacto na liberdade de empreender do locatário e no direito de propriedade do fiador, especialmente porque a fiança é a garantia menos custosa e mais aceita pelos locadores.

  1. Seguro Fiança

Se o Fiador é a garantia mais procurada pelos locatários, o seguro fiança tem se mostrado a garantia “queridinha” dos locadores.

Embora listada como uma garantia, o seguro fiança, como o próprio nome sugere, mais se assemelha a um seguro, e tem características de um contrato de seguro. Portanto, ele é contratado para garantir o cumprimento das obrigações locatícias em caso de sinistro.

Nesse caso, com efeito, a seguradora assumi a obrigação de indenizar o segurado em caso de sinistro, mediante pagamento, anual ou mensal, pelo locatário.

E é aqui é entendemos a vantagem aos locadores: é mais fácil acionar a seguradora que cobrar aluguéis e encargos do locatário ou fiador no Judiciário. Além dos custos das taxas judiciárias e honorários advocatícios, o locador não tem garantia de ver seus danos financeiros ressarcidos.

Segundo a Lei do Inquilinato, o seguro fiança abrangera a totalidade das obrigações do locatário.

Embora a lei determine assim determine, na prática, isso pouco ocorre. Normalmente, as partes contratam coberturas para apenas algumas obrigações, deixando outras de fora, com o intuito de minimizar os custos ao locatário.

Mas é importante o locador atentar-se para a extensão das coberturas e o valor da indenização.

Ao locatário, as seguradoras normalmente fazem uma avaliação de cadastro, o perfil do segurado, semelhante à realizada pelas instituições financeiras nos pedidos de crédito, verificando riscos para fixação do valor de seguro e as formas de pagamento.

Isso significa que a solicitação pode ser negada se o requerente tiver o nome incluso nos órgãos de proteção ao crédito ou se a seguradora concluir que ele não tem possibilidade de arcar com o pagamento do aluguel.

  1. Cessão Fiduciária de Quotas de Fundo de Investimento

Essa modalidade de garantia, não tão comum no mercado, assusta muita gente com o nome.

O processo é mais complexo e, como o próprio nome já esclarece, as quotas de um fundo de investimento será a garantia do contrato de locação. Portanto, há um fundo de investimento por trás da transação.

O titular das cotas do fundo pode ser o próprio locatário ou um terceiro. Se for o terceiro, com efeito, deverá indicá-lo no contrato de locação feito com o locador.

A cessão fiduciária é uma forma de transferir a propriedade das quotas em caráter resolúvel, ou seja, até que o locatário cumpra com todas as suas obrigações, a propriedade das quotas é do locador. Contudo, depois de cumpridas as obrigações, a propriedade das quotas retorna para o seu título original.

A Lei 11.196/2005 e a Instrução nº 432/2006 da CVM (Comissão de Valores Imobiliários) determinam o procedimento de constituição desse tipo de garantia.

  1. Exigência de Dupla Garantia

Em tempos tão incertos como os que vivemos atualmente, muitos locadores se veem tentados a exigir duas garantias. Afinal, “o seguro morreu de velho”.

Mas nos contratos de locação, essa premissa não pode ser aplicada.

Isso porque a Lei do Inquilinato é expressa em vetar a exigência de uma dupla garantia na locação.

A exigência da dupla garantia constitui contravenção penal, punível com prisão simples de 05 dias a 06 meses ou multa de 3 a 12 meses do valor do último aluguel.

E o risco de penalidade não existe apenas ao locador. À imobiliária que exige além do locatário no que diz respeito à garantia é cabível reclamação junto ao órgão regulamentador e fiscalizador, atualmente o CRECI, que pode aplicar desde advertência, multa e suspenção das atividades.

Assim sendo, tanto é proibida a dupla garantia, que a referida conduta enseja punição de quem o fizer, se tratando de hipótese plenamente rechaçada pela Lei do Inquilinato.

Em uma eventual discussão judicial de um processo que possua uma dupla garantia, o impasse pode ser resolvido conforme o entendimento pacífico dos tribunais brasileiros no sentido de se excluir a mais gravosa ao locatário, tendo como fundamento legal a analogia do artigo 620 do Código de Processo Civil.

  1. E como fica o pagamento do aluguel?

Ainda, na ânsia de se ver segurado, além da garantia, o locador exige do locatário o pagamento do aluguel de forma antecipada, ou seja, o conhecido “paga para morar”.

Pode? Não!

A Lei vincula o pagamento do aluguel antecipado apenas em casos em que o contrato não possua nenhuma modalidade de garantia prevista contratualmente ou para aluguel de temporada.

  1. Conclusão

As garantias locatícias nada mais são que formas de assegurar o locador do cumprimento das cláusulas firmadas no contrato de locação e a Lei do Inquilinato traz um rol taxativo de possibilidades de garantias a se exigir e apresentar em um contrato de locação.

Cabe às partes envolvidas avaliar cada uma delas e verificar a que melhor se adequa à sua realidade, seja para segurança ou realidade financeira.

Ainda assim, cada uma delas apresenta seus riscos e vantagens.

Porém, o locatário não precisa sujeitar a exigências além do determinado para se ver garantido um contrato de locação. Até porque a exigência ilegal não traz vantagens e seguranças ao locador, podendo ser questionadas no Judiciário.

Por isso, fique atento!

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